A educação para a democracia entre a vulnerabilidade e a autossuficiência humana

Autores
Cenci, Angelo Vitório
Año de publicación
2014
Idioma
portugués
Tipo de recurso
artículo
Estado
versión aceptada
Descripción
O presente texto vale-se da abordagem de Martha Nussbaum para retomar um velho e fundamental tema da literatura e da filosofia com o objetivo de vinculá-lo ao âmbito educativo. O artigo toma Nussbaum como referência para tematizar a tensão clássica existente entre vulnerabilidade e autossuficiência humana e discutir as implicações de tal tensão ao campo da educação para a democracia. Defende-se a posição que a educação para a vida democrática depende do modo como tal tensão é conduzida nos processos educativos. Desse modo, dado que esses dois elementos são intrínsecos à condição humana, a educação para a democracia depende do cultivo de uma autossuficiência moderada na busca de sentido para a vulnerabilidade humana. Veremos que o anseio de invulnerabilidade é algo que que se faz presente já nas construções mitológicas e recebe um insight reflexivo, embora sempre de maneira tensa, na literatura e na filosofia grega. Esse anseio é explicitado com lucidez na literatura homérica, na poesia trágica, em Píndaro, na filosofia aristotélica e também na obra pedagógica de Rousseau. Por se tratar de uma tensão antropológica veremos o alcance de sua retomada contemporânea por Nussbaum e as consequências por ela apontadas para a esfera da educação para a democracia. Nesse sentido, pode-se concordar com Nussbaum que o futuro da humanidade só pode ser forjado exitosamente mediante a cooperação, o que lembra Dewey, autor que já no início do século passado propôs uma educação orientada para a cidadania mundial. Somente tal perspectiva educativa permite ultrapassar um duplo risco que afeta a educação para a democracia no atual cenário. O primeiro diz respeito a um modelo de educação que ressalta a autossuficiência e nega a dimensão de vulnerabilidade do ser humano. Para tal, Nussbaum indica ser necessário um tipo de educação e de ensino que englobe uma formação humanística, calcada no cultivo da imaginação. Esse tema, tão caro à tradições como a deweyana e a arendtiana, necessita ser retomado e Nussbaum oferece uma importante contribuição para tal. Nesse sentido, há que se levar devidamente em conta sua tese de que é necessário à criança aprender a não aspirar ao controle e à invulnerabilidade e nem definir suas possibilidades como superiores às do restante da humanidade, mas vivenciar a experiência da debilidade humana numa grande variedade de circunstâncias sociais. O segundo risco concerne ao problema da redução da educação à aprendizagem e ao lucro. Tal modelo reduz o educando a um consumidor de serviços educacionais e o educador a um prestador de tais serviços. Uma educação para a democracia, perspectivada nos termos que foram esboçados até aqui, tem de ser colocada para além da perspectiva reducionista de preparar sujeitos para o mercado de trabalho, a geração de renda e a ampliação do produto interno bruto. A questão que se coloca então é que tipo de educação possibilita aos jovens entender seu mundo interior e o mundo mais amplo onde vivem; que tipo de educação lhes cria condições para exercer a cidadania de modo ativo e reflexivo, a curiosidade, a responsabilidade pessoal e o pensamento crítico; que tipo de educação propicia o desenvolvimento da imaginação criativa e o exercício da tolerância, o exercício solidário da democracia e o fomento de uma vida plena de significado; que tipo de educação ajuda a criar condições para a formação de um educando que tenha condições de pensar criticamente, desenvolver a capacidade imaginativa e a empatia e estar voltado para uma cidadania mundial. O êxito de tal educação passa, pois, pela adequada condução da problemática originária do aprender a orientar a vulnerabilidade humana em direção a uma autossuficiência que não perca de vista a fragilidade do bem viver humano e, ao mesmo tempo, ajude os sujeitos, de algum modo, a viverem melhor como humanos e a darem um sentido mais pleno a suas vidas. A autossuficiência humana terá, pois, na forma de um rosto de Janus, de ser sempre mediada com sua outra face, a vulnerabilidade. Desse modo, aspirar a um modo de vida humano, digno de ser vivido, terá de contemplar sempre as limitações intrínsecas ao humano. Tais limitações tendem a ser melhor orientadas se as fragilidades do bem viver humano forem bem conduzidas e orientadas na direção de um autêntico modo de vida em comum. No percurso argumentativo desenvolvido no artigo retoma-se, inicialmente, com base na autora, como a tensão entre vulnerabilidade e autossuficiência traduz um traço fundamental da condição humana; na sequência, faz-se uma volta aos gregos, principalmente ao mito e à poesia trágica, para resgatar o sentido originário de tal tensão; na continuidade, aborda-se a busca da autossuficiência mediante a razão e seus limites na filosofia grega, sobretudo aristotélica para, por fim, novamente com base na abordagem de Nussbaum sobre a ideia de educação democrática, extrair algumas consequências da tensão entre vulnerabilidade e autossuficiência humana em vista da educação para a democracia.
Fil: Cenci, Angelo Vitório. Universidade de Passo Fundo; Brasil
Materia
Educación
Vulnerabilidad
Procesos de aprendizaje
Democracia
Nivel de accesibilidad
acceso abierto
Condiciones de uso
http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/2.5/ar/
Repositorio
RIDAA (UNICEN)
Institución
Universidad Nacional del Centro de la Provincia de Buenos Aires
OAI Identificador
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O primeiro diz respeito a um modelo de educação que ressalta a autossuficiência e nega a dimensão de vulnerabilidade do ser humano. Para tal, Nussbaum indica ser necessário um tipo de educação e de ensino que englobe uma formação humanística, calcada no cultivo da imaginação. Esse tema, tão caro à tradições como a deweyana e a arendtiana, necessita ser retomado e Nussbaum oferece uma importante contribuição para tal. Nesse sentido, há que se levar devidamente em conta sua tese de que é necessário à criança aprender a não aspirar ao controle e à invulnerabilidade e nem definir suas possibilidades como superiores às do restante da humanidade, mas vivenciar a experiência da debilidade humana numa grande variedade de circunstâncias sociais. O segundo risco concerne ao problema da redução da educação à aprendizagem e ao lucro. Tal modelo reduz o educando a um consumidor de serviços educacionais e o educador a um prestador de tais serviços. 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A questão que se coloca então é que tipo de educação possibilita aos jovens entender seu mundo interior e o mundo mais amplo onde vivem; que tipo de educação lhes cria condições para exercer a cidadania de modo ativo e reflexivo, a curiosidade, a responsabilidade pessoal e o pensamento crítico; que tipo de educação propicia o desenvolvimento da imaginação criativa e o exercício da tolerância, o exercício solidário da democracia e o fomento de uma vida plena de significado; que tipo de educação ajuda a criar condições para a formação de um educando que tenha condições de pensar criticamente, desenvolver a capacidade imaginativa e a empatia e estar voltado para uma cidadania mundial. O êxito de tal educação passa, pois, pela adequada condução da problemática originária do aprender a orientar a vulnerabilidade humana em direção a uma autossuficiência que não perca de vista a fragilidade do bem viver humano e, ao mesmo tempo, ajude os sujeitos, de algum modo, a viverem melhor como humanos e a darem um sentido mais pleno a suas vidas. A autossuficiência humana terá, pois, na forma de um rosto de Janus, de ser sempre mediada com sua outra face, a vulnerabilidade. Desse modo, aspirar a um modo de vida humano, digno de ser vivido, terá de contemplar sempre as limitações intrínsecas ao humano. Tais limitações tendem a ser melhor orientadas se as fragilidades do bem viver humano forem bem conduzidas e orientadas na direção de um autêntico modo de vida em comum. 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Esse tema, tão caro à tradições como a deweyana e a arendtiana, necessita ser retomado e Nussbaum oferece uma importante contribuição para tal. Nesse sentido, há que se levar devidamente em conta sua tese de que é necessário à criança aprender a não aspirar ao controle e à invulnerabilidade e nem definir suas possibilidades como superiores às do restante da humanidade, mas vivenciar a experiência da debilidade humana numa grande variedade de circunstâncias sociais. O segundo risco concerne ao problema da redução da educação à aprendizagem e ao lucro. Tal modelo reduz o educando a um consumidor de serviços educacionais e o educador a um prestador de tais serviços. Uma educação para a democracia, perspectivada nos termos que foram esboçados até aqui, tem de ser colocada para além da perspectiva reducionista de preparar sujeitos para o mercado de trabalho, a geração de renda e a ampliação do produto interno bruto. A questão que se coloca então é que tipo de educação possibilita aos jovens entender seu mundo interior e o mundo mais amplo onde vivem; que tipo de educação lhes cria condições para exercer a cidadania de modo ativo e reflexivo, a curiosidade, a responsabilidade pessoal e o pensamento crítico; que tipo de educação propicia o desenvolvimento da imaginação criativa e o exercício da tolerância, o exercício solidário da democracia e o fomento de uma vida plena de significado; que tipo de educação ajuda a criar condições para a formação de um educando que tenha condições de pensar criticamente, desenvolver a capacidade imaginativa e a empatia e estar voltado para uma cidadania mundial. O êxito de tal educação passa, pois, pela adequada condução da problemática originária do aprender a orientar a vulnerabilidade humana em direção a uma autossuficiência que não perca de vista a fragilidade do bem viver humano e, ao mesmo tempo, ajude os sujeitos, de algum modo, a viverem melhor como humanos e a darem um sentido mais pleno a suas vidas. A autossuficiência humana terá, pois, na forma de um rosto de Janus, de ser sempre mediada com sua outra face, a vulnerabilidade. Desse modo, aspirar a um modo de vida humano, digno de ser vivido, terá de contemplar sempre as limitações intrínsecas ao humano. Tais limitações tendem a ser melhor orientadas se as fragilidades do bem viver humano forem bem conduzidas e orientadas na direção de um autêntico modo de vida em comum. No percurso argumentativo desenvolvido no artigo retoma-se, inicialmente, com base na autora, como a tensão entre vulnerabilidade e autossuficiência traduz um traço fundamental da condição humana; na sequência, faz-se uma volta aos gregos, principalmente ao mito e à poesia trágica, para resgatar o sentido originário de tal tensão; na continuidade, aborda-se a busca da autossuficiência mediante a razão e seus limites na filosofia grega, sobretudo aristotélica para, por fim, novamente com base na abordagem de Nussbaum sobre a ideia de educação democrática, extrair algumas consequências da tensão entre vulnerabilidade e autossuficiência humana em vista da educação para a democracia.
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